Capítulo 11 — Só coincidência... né?
Só coincidência... né?
A noite caiu mais cedo.
O tempo estava abafado, mas com vento.
E dentro da casa, as luzes pareciam mais suaves do que o normal.
Nicole dormia no sofá com um livro aberto sobre o peito.
Yuna estava no banho — provavelmente cantarolando algo fora de tom.
O silêncio se espalhava como uma névoa boa pela casa.
Violet e Ayaka estavam no quarto, sentadas no chão.
Ambas de pijama. Uma com caneca de chá, a outra com suco gelado.
A televisão estava ligada, mas o volume era quase imperceptível.
Algum episódio de anime repetido. Só pra enfeitar o fundo.
Ayaka segurava o sketchbook novo que tinha ganhado de Nick.
Passava os dedos pela capa, distraída.
— “Você acha… que o pai guarda coisas demais?”
A pergunta veio baixa. Mas carregada.
Violet demorou um pouco pra responder.
— “Guarda. Mas não é bagunça. É tipo… curadoria.”
— “Como assim?”
— “Tipo uma galeria silenciosa. Mas só ele sabe o que vale e o que não.”
Ayaka assentiu, ainda olhando pra capa do caderno.
— “Aquele console da 2B…”
Violet virou os olhos devagar.
— “Você viu também?”
Ayaka ergueu o rosto.
— “Você já tinha visto?”
— “Não. Mas depois da ligação...”
— “A do japonês?”
— “É.”
O silêncio se esticou entre elas.
Ayaka deitou de lado no tapete, o caderno apoiado na barriga.
— “A mãe… ela responde em japonês como se fosse português.”
— “Ela fala como quem nunca desaprendeu.”
— “E age como se fosse só… mais uma coisa.”
Violet bebia devagar.
— “Acha que tem coisa escondida?”
— “Acho que… tem coisa não falada.”
Violet soltou o ar, encostando-se à parede.
— “Não é a mesma coisa?”
— “Acho que não. Coisa escondida é ativa. Coisa não falada… é quase carinho.”
As duas ficaram olhando pro teto.
Na TV, uma personagem chorava silenciosamente.
A legenda dizia: "Eu não queria que você descobrisse assim."
Nenhuma das duas leu.
Mas ambas ouviram.
Violet virou o rosto.
— “Você já achou que conhecia alguém... mas depois começou a perceber que talvez só conhecia uma parte?”
Ayaka virou-se também.
— “Sim. Ultimamente... todo dia.”
— “E isso te assusta?”
Ayaka pensou.
Depois disse, com calma:
— “Me assusta mais a ideia de não perguntar nunca.”
Violet sorriu de canto.
— “Você sempre foi a corajosa.”
— “E você sempre foi a atenta.”
Silêncio.
Depois as duas riram, baixinho.
— “Então a gente é tipo um quebra-cabeça?” perguntou Violet.
— “Não. A gente é tipo duas peças do mesmo quebra-cabeça tentando descobrir a imagem da caixa sem ter a tampa.”
Violet gargalhou de verdade.
Ayaka acompanhou.
Por um instante, o peso diminuiu.
Mas não sumiu.
Porque mesmo rindo, mesmo distraídas, havia algo ali…
Na prateleira, no presente bem embalado, nas palavras ditas com calma demais…
Algo que estava crescendo em silêncio.
Fim do Capítulo 11