Capítulo 12 — O mesmo corredor, o último ano
O mesmo corredor, o último ano
O portão do colégio sempre fazia um rangido meio engasgado quando abria.
Ayaka já tinha cronometrado mentalmente: do portão até a escada, dava tempo de terminar uma música inteira — se ela escolhesse a versão acústica.
Violet preferia ir ouvindo as pessoas conversando.
Não porque gostasse, mas porque sempre achava engraçado o que diziam nos corredores:
— “Prova de história foi um crime de guerra.”
— “O diretor tá com a mesma camisa de terça passada.”
— “A Yuna tá doida de novo, olha a calça dela.”
O prédio era antigo.
Pintura manchada, azulejos rachados no pátio, fios aparentes em cima da sala dos fundos.
Mas a vista do segundo andar era linda.
E a turma delas, por mais caótica, tinha virado uma mini-família.
Na sala, já haviam colado recortes com frases bobas na parede:
"Um café e um ponto a mais, por favor."
"Se a arte é sofrimento, então já passei de ano."
"Não é desleixo, é conceito visual."
Ayaka gostava de observar tudo.
Violet fingia que não ligava — mas sempre sentava no mesmo lugar, de onde podia ver a janela e a porta.
Yuna chegou na sala com uma garrafinha térmica na mão e o cabelo preso num coque malfeito com lápis de cor no lugar de prendedor.
— “Bom dia, infelizes criativos!”
— “Bom dia, senhora doida,” respondeu alguém.
Yuna jogou a bolsa na cadeira e tirou um papel amassado do bolso.
— “Hoje é dia de atividade sensorial.”
— “O que é isso?” perguntou Ayaka.
— “Desenhar com os sentimentos.”
Ela fez pose de mística.
— “Vocês vão fechar os olhos e desenhar o que lembram da infância. Mas sem levantar o lápis. Linhas contínuas. Sem pensar demais.”
Violet ergueu uma sobrancelha.
— “Você inventou isso agora?”
— “Claro que não. Isso aqui foi ideia do seu pai.”
A sala silenciou.
Violet piscou.
Ayaka também.
Yuna arregalou os olhos e riu.
— “Quer dizer, de um professor antigo. Que nem dava aula de arte. Mas... era bom com emoções.”
Ela virou pro quadro e mudou de assunto rápido demais.
Violet olhou pra Ayaka.
Ayaka fingiu que estava mexendo no estojo.
A aula seguiu.
Os desenhos saíram tortos, engraçados, alguns até emocionantes.
Yuna andava entre as mesas comentando coisas como:
— “Esse parece um coração quebrado com pressa.”
— “Isso aqui é uma vaca ou sua infância rural?”
— “Bonito. Triste. Mas bonito.”
No intervalo, Violet ficou na escada com um pão de queijo na mão.
Ayaka sentou ao lado com uma caixinha de suco.
— “Acho que ela ia falar do pai, né?”
— “Acho que sim.”
— “Mas por que ela esconde?”
Violet deu de ombros.
— “Ela sempre foi assim. Brinca, e esconde. Igual a mãe.”
— “Você reparou como o colégio parece... menor esse ano?”
— “É porque a gente tá de saída.”
Ayaka sorriu.
— “Isso assusta?”
— “Não. Mas tem um sentimento novo chegando.”
— “Tipo o quê?”
Violet ficou em silêncio.
Depois disse:
— “Tipo algo que vem depois de um segredo. Mas que ainda não tem nome.”
Fim do Capítulo 12