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Capítulo 20Boa noite... e surpresa

Boa noite... e surpresa

A noite caiu sobre a casa japonesa com uma calma quase cinematográfica.

A mesa estava posta com cuidado:

tigelas de arroz recém-cozido, missoshiru quentinho, fatias de peixe grelhado com molho cítrico, vegetais salteados e uma jarra de chá gelado com limão.

Tudo tinha cheiro de casa — mesmo sendo do outro lado do mundo.

Nicole ajeitava os hashis com naturalidade, enrolando os fios de cabelo que escapavam do coque.

Ayaka e Violet estavam de moletom e chinelos de quarto, ainda meio zonzas pelo fuso.

Elas se sentaram à mesa com movimentos lentos, tentando entender se estavam em um sonho ou num episódio de anime.

Na geladeira, um bilhete preso com um ímã da Jump:

"Chego pra janta com um amigo. Não comam tudo. — Nick."

Violet leu em voz alta.

— “Ele já tem amigo aqui?”

— “É... digamos que sim,” disse Nicole, sorrindo.

Antes que pudessem especular, o portão eletrônico fez um “beep” e a maçaneta girou.

Entrou primeiro o Nick, carregando uma sacola de papel com alguma bebida e um pacote de bolinhos prontos.

— “Tô de volta.”

— “Demorou,” disse Nicole, pegando a sacola.

Logo atrás dele…

— “Oi, oi, licença. Cheguei!”

Um homem de cabelo preto com algumas mechas grisalhas, óculos de aro fino, casaco casual, e um sorriso de quem já sabe o final da piada.

As meninas olharam pra ele.

Nick apontou:

— “Esse aqui é o Murata.”

Nicole só acenou com a cabeça, como quem já esperava.

Ayaka e Violet se entreolharam.

Sussurraram, quase ao mesmo tempo:

— “...o quê?”

Murata tirou os sapatos com educação e entrou rindo.

「ああ〜懐かしい匂いだね。ニックの家はいつも落ち着く!」

"Aaah, esse cheirinho de comida. A casa do Nick sempre tem um clima bom!"

As meninas olharam uma pra outra com aquele desespero de quem sabe que vai passar a noite inteira só sorrindo e acenando.

Murata sentou-se com animação, colocou os hashis na tigela, ergueu a cabeça...

E disse com um sotaque extremamente japonês, mas claro:

— “Nossa... como vocês cresceram!”

As duas congelaram.

— “QUÊ?!”

— “Vocês ainda desenham?”

Ayaka quase derrubou o hashi.

Violet arregalou os olhos.

— “Ele... ele falou... português?”

— “Sim,” disse Murata, sorrindo.

— “Eu aprendi com Nick. E com... dorama brasileiro.”

— “Dorama...?!” Ayaka segurava o riso.

— “A novela do hospital. Aquela com médico que trai todo mundo. Muito drama. Muito grito.”

Violet quase cuspiu o chá.

Murata olhou para elas com olhos brilhantes.

— “Nick sempre fala: ‘minhas filhas muito artistas’. Ele mostra desenho no celular. Tipo... todos.”

Nicole riu baixinho, escondendo o rosto no copo.

— “Mentira...” disse Ayaka, já vermelha.

— “Murata-sensei, você não precisa contar TUDO,” disse Nick, tentando manter a compostura.

Murata olhou pra ele e respondeu, em português quebrado:

— “Mas é verdade! Eu gosto muito de sua família. Você é bobo.”

As meninas riram.

Nicole olhou pra elas com carinho.

Nick também.

E por um momento… a mesa estava cheia de vozes, riso, pratos sendo passados, confusão entre japonês e português, e uma energia que não vinha de nenhum segredo — mas da sensação rara de estar exatamente onde se deveria estar.

No fim da janta, Murata foi embora com um “mata ne!” alegre e um aceno desajeitado.

Nick se jogou no tatami da sala com um suspiro longo.

Nicole recolhia os pratos com um sorriso leve.

Violet e Ayaka estavam no sofá, processando tudo.

— “Ele é o Murata,” disse Violet.

— “O Murata,” repetiu Ayaka.

— “Ele fala português.”

— “Ele vê novela brasileira.”

Silêncio.

— “Nosso pai... tem amigos assim desde quando?”

Nicole, passando pela sala com um pano na mão, apenas respondeu:

— “Desde muito antes de vocês saberem o que era misturar cores num papel.”

E seguiu.

Deixando as filhas no sofá, abraçadas ao riso e à confusão mais feliz que já sentiram.

Fim do Capítulo 20